
quarta-feira, 1 de agosto de 2007

Uma Razão de ficção
Não lembro quando a conheci, era linda, de olhos brilhantes e, dona do sorriso mais triste que já vi. Ela narrava completas tragédias de sua vida, perseguições implacáveis que sofria. Ela acreditava crer profundamente em sua tristeza e me convencia de tal forma, que ficava comovido, questionando os porquês daquele destino.
Ela sumia, eu ficava meses sem vê-la, de repente, nossos caminhos se entrelaçavam, e de novo o drama, a doença, o mau casamento, era como se transportasse toda sua tragédia em uma bolsa à tira-colo. Na última vez que a vi, fiquei tão preocupado, que à noite liguei para sua casa, sua irmã atendeu, sorridente e calma, ao lhe perguntar sobre a Irmã, disse-me que havia saído com o namorado, que fora ao cinema e de lá iam dançar. Calei revoltado e me despedi. Que mulher era aquela? Que morria de dia e à noite ia namorar? Julguei-me um tolo e uma nuvem de impropérios me sacudiu o pensamento.Esquecer era a solução, ou ela era louca ou praticava teatro consigo mesma, afinal, estava bem. Estava certo e decidido, não mais pensaria na tal mulher.
A natureza, às vezes, interfere na compreensão da razão de tal forma, que a explicação para isto é uma divagação esdrúxula e sem brilho. Certa tarde, olhei no canteiro um animal quieto, parado, era uma rã marrom-molhada, olhei fixamente e me aproximei ao perceber que o animal não se movia, para a minha surpresa era uma folha da amendoeira, olhei de novo do mesmo lugar de antes, lá estava a rã, era enfim, era uma questão de percepção e de sensibilidade.
Precisei ir à papelaria, ao chegar lá, deparei com a mulher sofredora, tentei fazer de conta que não a tinha visto, ela estava com a irmã, a sorridente, as duas me viram, a sofredora nada falou, parecia estar em choque de tristeza, a irmã me cumprimentou e disse que tinham sido assaltadas em casa e devido ao trauma, mudaram de endereço, a sofredora me entregou um bilhete com frases do seu sofrimento e com os nomes dos remédios que estava tomando, me despedi, desta vez nem olhei para trás. Pareciam duas loucas, uma sorridente e a outra sofredora. Tempos mais tarde, ao chegar em minha casa, à noite, recebi um recado que a mulher sofredora deixara um panfleto de propaganda, me avisando de um concurso de contos. Eu entendi menos ainda a razão daquela mulher, que fazia força de existir na razão e na ficção. Sentei, peguei minha caneta tinteiro, eis os fatos.
Leddo Dommus
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